terça-feira, 13 de janeiro de 2009

HILÁRIO DE POITIERS, BISPO E DOUTOR DA IGREJA

INTRÉPIDO DEFENSOR DA FÉ NA TRINDADE

Damos hoje início a uma série de reflexões sobre os autores e as obras mais antigas do cristianismo, ficando esta época conhecida por “patrística” ou dos Padres da Igreja, isto é, daqueles que colocaram os alicerces da doutrina cristã e da reflexão teológica posterior.

Coincidindo, pois, o dia 13 de Janeiro com a celebração da memória de Santo Hilário de Poitiers, bispo e doutor da Igreja do sec IV, dedicaremos, então, esta primeira e breve abordagem a ele.

Hilário de Poitiers nasceu por volta do ano 315 em Pictavium, actual Poitiers, na Gália, no seio de uma das mais distintas famílias da Província da Aquitânia. Enquanto pagãos, os pais educaram-no na ciência da antiga Grécia e Roma e em todas as práticas da gentilidade.

Procurou, na filosofia do seu tempo, a luz da verdade plena sem a encontrar, até que por volta dos 30 anos conheceu e aceitou o Evangelho como a suprema fonte de luz e verdade e converteu-se ao cristianismo, tendo recebido o baptismo, ele e a seguir toda a sua família.

Por esta época, e terminadas as perseguições religiosas, a Igreja começou a viver exteriormente um período de paz. Porém, no seu interior isso tal não acontecia, pois pululavam as doutrinas heréticas, sobretudo o arianismo, que deu origem a graves e constantes conflitos internos.

E foi precisamente no combate acérrimo a esta heresia que Hilário de Poitiers, já no desempenho do seu múnus episcopal, se destacou e testemunhou a valentia do seu precioso zelo e competência doutrinal e pastoral.

Cognominado por S. Jerónimo de “trombeta contra os arianos”, malleus Arianorum ("martelo contra arianos") e “Atanásio do Ocidente”, recebeu também de Santo Agostinho um significativo elogio: “valorosíssimo defensor da fé contra os hereges e digno de toda a veneração”.

Sofreu muito ao longo deste permanente combate e defesa da fé cristã, posta em causa na unidade da Trindade e na divindade da Pessoa de Cristo. Devido à sua resistência enérgica a heresia arianista, de facto, não imperou!

Ao longo do exílio que sofreu e antes de falecer, no dia 13 de Janeiro de 367, Hilário escreveu muito a fim de propagar e defender a ortodoxia doutrinal. Dele nos ficaram muitas obras, sendo as mais conhecidas: De Trinitate (onde defende a "consubstanciação" do "Filho" com o "Pai", em oposição ao arianismo), Contra Arianos vel Auxentium Mediolanensem liber, Contra Constantium Augustum liber, Commentarius in Evangelium Matthaei e Tractatus super Psalmos.

Foi proclamado Doutor da Igreja, pelo Papa Pio IX, em 1851.
Fiquemo-nos então, e para concluir, com um extracto da sua obra De Trinitate, a qual retrata claramente a intrepidez da sua fé, bem como a competência e rigor teológico deste grande Padre e Doutor da Igreja:

«Eu estou bem consciente, Deus Pai Omnipotente, de que a Vós devo consagrar a mais importante tarefa da minha vida, de modo que todas as minhas palavras e todos os meus pensamentos falem de Vós. O exercício da palavra que me concedestes não pode ter recompensa maior que a de Vos servir pregando-Vos, e demonstrar ao mundo que o ignora, ou ao herege que o nega, que sois Pai, isto é, o Pai do Deus Unigénito.
Embora seja esta a minha única intenção, é necessário para isso invocar o auxílio da vossa misericórdia, para que, desfraldando nós a vela da nossa confissão de fé, a enchais com o sopro do vosso Espírito e nos guieis pela rota da pregação que iniciámos. Não nos há-de faltar Aquele que prometeu: Pedi e recebereis, procurai e achareis; batei à porta e abrir-se-vos-á.
Somos pobres, e por isso Vos pedimos o que nos falta; perscrutamos com esforço diligente as palavras dos vossos Profetas e Apóstolos e chamamos com insistência para que se nos abram as portas do conhecimento da verdade; mas é de Vós que depende conceder o que se pede, estar presente quando se procura, abrir a quem bate à porta.
Quando se trata de compreender as verdades que se referem a Vós, vemo-nos impedidos por um certo entorpecimento preguiçoso da nossa natureza e sentimo-nos limitados pela nossa inevitável ignorância e debilidade; mas o estudo da vossa doutrina nos dispõe para o sentido das realidades divinas e a submissão da fé nos leva a superar o nosso conhecimento natural.
Esperamos portanto que façais progredir o nosso tímido esforço inicial, que consolideis o seu desenvolvimento crescente e o leveis à união com o espírito dos Profetas e dos Apóstolos, para que compreendamos o sentido exacto das suas palavras e interpretemos o seu verdadeiro significado.
Vamos falar do que eles pregaram no sacramento: que Vós sois o Deus eterno, Pai do Unigénito Deus eterno; que só Vós sois sem nascimento; e que há um só Senhor Jesus Cristo, que de Vós procede por nascimento eterno; não afirmamos que Ele seja outro deus diverso de Vós, mas proclamamos que foi gerado de Vós que sois o único Deus; e confessamos que Ele é Deus verdadeiro, nascido de Vós que sois verdadeiro Deus e Pai.
Abri-nos, portanto, o significado autêntico das palavras, dai-nos a luz da inteligência, a perfeição da linguagem, a verdadeira fé. Fazei que sejamos capazes de exprimir a nossa fé: que Vós sois o único Deus Pai e que há um só Senhor Jesus Cristo, segundo o que nos transmitiram os Profetas e os Apóstolos. E contra os hereges que o negam, fazei que saibamos afirmar que Vós sois Deus com o Filho e que proclamemos sem erro a sua divindade» (Liv. 1, 37-38, in PL 10, 48-49).

Drª. Teresa Pereira

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