quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

PADRES DA IGREJA

CONCEITO E AUTORIDADE

Tanto “Patrologia” como “Patrística” provêm da mesma raiz linguística (padre), procurando cada uma delas, e segundo a metodologia própria utilizada, estudar os Padres da Igreja.

O que se entende, pois, por “Padres da Igreja”? A expressão “Padre” (= Pai) (pater, derivado do sânscrito pitar) possui diversos âmbitos de aplicação.

Na Sagrada Escritura, para além de se aplicar por excelência a Deus, é, de forma ampla, aplicada aos antepassados segundo a carne até Adão, tido mesmo como “o pai do mundo” (Cf. Sb. 10,1). Os antigos beneficiários das promessas e da aliança sinaítica, começando por Abraão, são também designados por “pais” (o Deus dos nossos pais...). A palavra conhece também uma utilização em sentido metafórico, no sentido de “mestre” e “guia”. A propósito, o próprio Jesus teceria duras críticas aos fariseus por se fazerem passar por “pais”, afirmando que «na terra, a ninguém chameis ‘Pai’, porque um só é o vosso ‘Pai’: aquele que está no Céu» (Mt. 23,9). Paulo considera-se “pai” daqueles que “gerou”, pelo anúncio do evangelho, (Cf. 1 Co 4,14-15) e na Primeira Carta a Timóteo 5,1 o título é atribuído aos anciãos.

O facto da iniciação e instrução na fé ser tida como uma autêntica paternidade espiritual levou, posteriormente, a atribuir-se o qualificativo de “pai” aos bispos. Assim, na idade sub-apostólica a relação entre ensino e paternidade aparece no “Martyrium Policarpi” onde, pela primeira vez, o termo pai=padre é atribuído a S. Policarpo, bispo de Esmirna, tido como “o pai dos cristãos” (12,2).

O mesmo qualificativo, mas na sua forma de “papa”, surge com bastante frequência em algumas cartas dirigidas a S. Cipriano, bispo de Cartago, facto que levou os estudiosos a concluir que tal título pareceria ser usual para qualificar todos os bispos metropolitas.

Contudo, é a partir do sec. IV que o uso do termo se estendeu a todos os que, apesar de não serem bispos, eram tidos como fiéis e autorizados representantes da Tradição da Igreja. Posteriormente, aplicou-se também aos ascetas e aos iniciadores e legisladores da vida monástica.

Utilizado no plural (Padres), passou a significar os bispos reunidos em concílio, dotados de autoridade na transmissão e explicação da fé. O título “Padre” foi aplicado, por exemplo, aos bispos presentes no Concílio de Niceia (325). A partir de então, a autoridade dos padres conciliares e de cada um dos bispos dotados de autoridade doutrinal passará a constituir uma referência constante nas controvérsias teológicas. A ortodoxia ou a heresia de uma doutrina será medida pelo ensinamento dos mesmos.

Na verdade, o conceito de “Padre”, tanto em sentido particular como em sentido colectivo, e que se imporá na Igreja dos primeiros séculos, refere-se, pois, àqueles que a nível da fé ou da disciplina deixaram uma marca na vida da comunidade cristã.

Cabe agora perguntar: quais os requisitos necessários para que um autor cristão da antiguidade possa gozar da prerrogativa de “Padre da Igreja”?

Foi o monge Vicente de Lérins que na sua obra “Commonitorium” (Memorial), redigida por volta do ano 435, apresenta as chamadas notas fundamentais que caracterizam e distinguem um simples autor eclesiástico de um Padre da Igreja. Apesar das mesmas serem alvo de várias críticas na actualidade, não deixam de ser uma referência clássica importante.

Assim, no nº 3 da obra supracitada, Vicente de Lérins define o Padre da Igreja pela sua: 1º- antiguidade (antiquitas ); 2º- ortodoxia de doutrina (doctrina orthodoxa); 3º- santidade de vida (insignis sanctitas); 4º- aprovação por parte da Igreja, no seio da qual viveu e morreu (approbatio expressa vel tacita ecclesiae).

Se, porventura, lhes falta uma ou mais destas notas fundamentais e características, possuem apenas, e na expressão de S. Jerónimo (Ep. 112,3), o título de “ecclesiae scriptores” ou “scriptores ecclesiastici” (escritores ecle-siásticos). Temos, por exemplo, o caso de Tertuliano que, a dada altura da sua vida, professou a doutrina herética do montanismo e Orígenes, que nem sem-pre conseguiu ser doutrinalmente “ortodoxo”...

Os autores cristãos, tanto da época patrística propriamente dita como da época pós-patrística, que souberam unir a excelência da sua doutrina (doctrina eminens) à pureza do ensinamento foram designados de “Doutores da Igreja” (Doctores Ecclesiae). Assim, no Oriente, foram proclamados como Grandes Doutores da Igreja: Atanásio, Basílio de Cesareia, Gregório de Nazianzo e. João Crisóstomo, ao passo que no Ocidente mereceram, por excelência, o título de Doutor: Ambrósio de Milão, Jerónimo, Agostinho de Hipona, Gregório Magno e Leão Magno, entre muitos outros que se lhes seguiram.

Drª. Teresa Pereira

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