quinta-feira, 25 de junho de 2009

SABER DIALOGAR

Nunca gostei de quem, para impor o seu capricho ou o seu ponto de vista, o faz aos gritos. E nunca considerei bem educada uma pessoa que decidiu não estar disponível para ninguém, ao ponto de não querer escutar ninguém nem se interessar na solução dos problemas dos outros. Contra a selva em que se tornou o mundo social, acho que vale a pena apostar forte no diálogo – a mais bem conseguida invenção humana capaz de aproximar pessoas e boas vontades. Pelo diálogo humilde e sincero, as pessoas aproximam-se e conhecem-se. No deserto do mundo, há sempre muita alegria quando se encontra um oásis de acolhimento e de escuta. Que o digam os amigos que há muito se não viam! No encontro entre pessoas, o diálogo realiza a missão de integrar as verdades parciais numa síntese mais ampla e permite conhecer melhor a realidade, pois, dada a limitação humana, cada um só a consegue ver de um modo parcial e incompleto. Da junção de diversificados pontos de vista consegue-se criar um mundo mais humano onde o bem comum se sobrepõe aos bens individuais. Mas... em qualquer situação humana, pública ou privada, o diálogo só existe verdadeiramente quando, na lógica da conversação, se dá prioridade ao acto de ouvir, em detrimento do acto de falar. Creio até que, neste pormenor, devemos seguir à risca a fisionomia; temos dois ouvidos e só uma boca – devemos escutar mais e falar menos.

Longe vai o tempo em que, sem televisão nem horários rígidos, havia tempo para amenas cavaqueiras, formativas umas e informativas outras. Tudo servia de mote para manter acesa a comunicação entre as pessoas. E se havia gente habilidosa para conservar acesa a atenção dos ouvintes durante horas a fio! Actualmente, por milhares de razões, falamos muito e escutamos pouco. Basta que nos dêem um pouquinho de corda e logo nos transformamos em papagaios autistas, tagarelas, com opinião sobre todas as matérias, sem tempo para escutar. Em vez de partilha de saberes, há imposição de opiniões, de “isto é assim”. Há monólogos, muita falação, muitas ideias, muitas opiniões – mas não há diálogo. Quando se juntam interlocutores à volta de uma mesa para «dialogarem» sobre qualquer assunto de interesse mútuo, cada qual esconde-se na guarita da própria opinião, discute, defende... mas não cede – e, no fim, todos saem de lá com as mesmas opiniões. A tecnologia individualizou os gostos e escangalhou as relações sociais; ao mesmo tempo, permite-nos ter opinião formada sobre todas as coisas, de tal modo que, sempre que é maré, lá estamos a debitar metros cúbicos de verborreia. Neste percurso, não está isenta de culpa a tecnologia das comunicações. A Internet cria redes anónimas, os telemóveis enviam mensagens impessoais, os fones dos mp3 estorvam a escuta exterior. Por muito que nos custe, temos de admitir que, por não darmos prioridade à escuta, o diálogo se tornou coisa rara, peça de museu.

A arte de dialogar aprende-se e exercita-se. Não aparece por magia. Mas exige algumas virtudes básicas que, sintetizadas, lhe dão o imprescindível substrato e aconchego. Primeira: O diálogo exige amor à verdade – não ser sincero é destruir, pela base, qualquer diálogo e, consequentemente, a confiança. Segunda: o diálogo exige muita humildade – a humildade manifesta-se no reconhecer, com apreço, a parte da verdade que o outro possui. Terceira: O diálogo exige muita atenção – a atenção tem duas vertentes: a própria e a do outro; deve ter-se em conta o que o próprio diz e respeitar com redobrado interesse o que o outro diz. Quarta: O diálogo exige inversão de perspectivas – é um bom truque, de efeitos inesperados, ver as coisas do ponto de vista do outro. Quinta: O diálogo exige um tempo adequado e um lugar tranquilo – tratar o “assunto” fora de tempo pode parecer ajuste de contas. Sexta: O diálogo exige muito respeito e paciência, e que se converse a frio, sem ferver! – Todos sabemos que, mesmo tendo razão, ninguém consegue “plantar” a verdade aos gritos! Escutar o semelhante constitui um fino acto de amor, uma bela obra de misericórdia.

P. Madureira da Silva

2 comentários:

  1. PELA VERDADE E BELEZA DE TEXTO QUE É...FOI UM MUITO BOM MOMENTO DE LEITURA!!!

    HÁ QUE FAZER CHEGAR A TODA A GENTE ESTES ENSINAMENTOS [ TÃO SIMPLES...] DE COMO É URGENTE "SABER OUVIR"!

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  2. gostei muito do texto que escreveu, é uma realidade que vivemos,desde os mais pequenos aos mais velhos, há uma frase que faz parte do dia a dia : não tenho paciência!!!! Não há paciência nem para escutar os outros, sobretudos os mais idosos, porque são " chatos" estão sempre a repetir o mesmo, etc., etc.Como dar a volta a isto?

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