terça-feira, 9 de março de 2010

“Epistula” Barnabae: a herança do judeo-cristianismo.

3- Resumo doutrinal (cont.)

“As Duas Vias”.
Questões morais: Sem dúvida que a parte substancial da secção moral radica na doutrina das “Duas Vias” ou “Dois Caminhos”. Neste campo, assemelha-se, de facto, ao conteúdo da Didaqué, embora com algumas ligeiras diferenças, fáceis de reconhecer tanto pelo estilo como pela intensidade teológica. Temos, por um lado, uma proposta de viver o cristianismo na sua radicalidade (caminho da luz) e outra uma advertência acerca dos perigos que assolam os cristãos ao desviarem-se dos ensinamentos do Senhor. O “caminho das trevas” não pode ser, portanto, uma marca distintiva do cristão, mas do pagão e, por isso, há que estar bem atento às “seduções” do mundo... Apesar do texto ser extenso, não podemos deixar de o transcrever integralmente, visto conter afirmações bastante actuais e úteis para todos nós: “ Existem dois caminhos de ensinamento e autoridade: o da luz e o das trevas. A diferença entre os dois é grande. De facto, sobre um estão colocados os anjos de Deus, portadores da luz; e sobre o outro, os anjos de Satanás. Um é Senhor de eternidade em eternidade, o outro é príncipe do presente tempo da iniquidade (XVIII, 1-2). Este é o caminho da luz: se alguém quer andar no caminho e chegar ao lugar determinado, que se esforce por meio das suas obras. Eis, portanto, o conhecimento que nos foi dado para andar nesse caminho. Ama aquele que te criou. Teme aquele que te formou. Glorifica aquele que te resgatou da morte. Sê simples de coração e rico de espírito. Não te ligues àqueles que andam no caminho da morte. Odeia tudo o que não é agradável a Deus. Odeia toda a hipocrisia. Não abandones os mandamentos do Senhor. Não te engrandeças a ti mesmo, mas sê humilde em todas as circunstâncias. Não te peças para ti qualquer glória. Não maquines o mal contra o teu próximo. Não te entregues à insolência. Não pratiques a prostituição, nem o adultério, nem a pederastia. Quando anunciares a palavra de Deus que não saia da tua boca impureza alguma. Não faças acepção de pessoas, ao corrigir alguém pela sua falta. Sê manso, tranquilo, respeitando as palavras que ouviste. Não sejas vingativo para com o teu irmão. Não vacilarás sobre o que vai ou não acontecer. Não tomes em vão o nome do Senhor. Ama o teu próximo mais do que a ti mesmo. Não mates o teu filho no seio da mãe, nem logo que ele tiver nascido. Não levantes a mão ao teu filho ou à tua filha. Pelo contrário, instrui-os, desde a infância, no temor do Senhor. Não cobices os bens do teu próximo. Não sejas avarento, não te juntes de coração com os grandes, mas conversa com os justos e pobres. Aceita como boas as coisas que te acontecem, sabendo que nada acontece sem o consentimento de Deus.

Não sejas dúplice no pensar e no falar, porque a duplicidade é armadilha mortal. Sê submisso aos teus senhores, com respeito e reverência, como à imagem de Deus. Não dês ordens com rudeza ao teu servo ou à tua serva, pois eles esperam no mesmo Deus que tu, para que não percam o temor de Deus, que está acima de uns e de outros; com efeito, ele não vem chamar a pessoa pela aparência, mas aqueles que o Espírito preparou. Compartilha tudo com o teu próximo, e não digas que as coisas são tuas. Se estais unidos nas coisas incorruptíveis, tanto mais nas coisas corruptíveis. Não sejas loquaz, porque a boca é armadilha mortal. Enquanto possas, guardarás a castidade da tua alma. Não sejas como os que estendem a mão na hora de receber e a retiram na hora de dar. Ama, como a pupila dos teus olhos, todo aquele que te anuncia a palavra de Deus. Lembra-te noite e dia, do dia do juízo. A cada dia, procura a companhia dos santos. Empenha-te com a pregação, exortando e preocupando-te em salvar uma alma pela palavra, e procura trabalhar com as tuas próprias mãos como forma de resgatares os teus pecados. Não hesites em dar, nem murmurarás quando deres, pois sabes quem é o verdadeiro remunerador da tua recompensa. Guarda o que recebeste, sem nada acrescentar ou tirar. Odeia totalmente o mal. Julga de modo justo. Não provoques divisão. Pelo contrário, reconcilia aqueles que se encontram desavindos. Confessa os teus pecados. Não te aproximes da oração de má consciência. (XIX, 1-12).

Ao contrário, “o caminho das trevas é tortuoso e cheio de maldição, pois é o caminho da morte eterna com tormentos. Nele se encontram as coisas que arruinam a alma dos homens: idolatria, insolência, altivez do poder, hipocrisia, duplicidade de coração, adultério, homicídio, roubo, orgulho, transgressão, fraude, maldade, arrogância, feitiçaria, magia, avareza e ausência do temor de Deus. Os que perseguem os bons odeiam a verdade, amam a mentira, ignoram a recompensa da justiça, não se ligam ao bem nem ao justo julgamento, não cuidam da viúva e do órfão, não velam pelo temor de Deus, mas para o mal, afastam-se da mansidão e da paciência, amam as vaidades, correm atrás da recompensa, não têm misericórdia para com o pobre, recusam ajudar o oprimido, estão sempre prontos para dizer mal do próximo, ignoram o seu Criador, matam as crianças [através do aborto,] corrompem a imagem de Deus, não se compadecem do necessitado, não se importam com os atribulados, defendem os ricos, são juízes injustos dos pobres, e, por fim, pecadores em tudo” (XX,1-2).

O textos não necessitam de qualquer comentário. Contudo, há a ressaltar um aspecto curioso e que se prende com a alusão à pederastia ( Cf. XIX,4) e à prática do aborto como práticas imorais (Cf. XIX,5 ; XX,2) e, portanto, indignas de um cristão. No enquadramento deste ensinamento e reflexão teológica, encontramos se dúvida, uma mensagem de vida e uma óptima proposta de felicidade que só é possível encontrar e realizar em Cristo, o verdadeiro e único “Caminho da Luz” e “Caminho da Vida”.
Drª. Teresa Pereira

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