terça-feira, 27 de abril de 2010

Pastor Hermae: a herança do judeo-cristianismo

Breve resumo doutrinal. Introdução (cont.)

Para podermos compreender o teor das afirmações deste escrito, é importante conhecer o contexto sócio-eclesial no qual teve origem. É isso que vamos hoje apresentar, de uma forma muito sintética.

O contexto sócio-eclesial no qual se desenrola a mensagem de Herm é bastante conturbado. O quadro eclesial apresentado pelo autor leva-nos, de facto, a concluir que a comunidade de Roma era já bastante numerosa e organizada hierarquicamente. Tal crescimento poderia, muito bem e em parte, estar associado a um certo relaxamento da fé e das virtudes cristãs, tão denunciado neste documento. Na sétima Parábola (Cf. 72,5) fala-se dos “hipócritas” e “introdutores de doutrinas estranhas” que convencem os cristãos “com as suas doutrinas vãs”. E a nona Parábola (Cf. 99,1) denuncia a existência, no seio da comunidade, de crentes “duros de inteligência e arrogantes... que tudo desejam conhecer e absolutamente nada sabem”. Trata-se, pois, de uma alusão ao gnosticismo emergente que começa a ameaçar a essência da fé cristã, desde a primeira metade do sec. II, precisamente quando as grandes figuras da falsa gnose se estabelecem em Roma.

Neste preciso contexto, para além de existirem muitos cristãos justos e “confessores” corajosos, conviviam quotidianamente alguns cristãos mais tépidos, indecisos ou duvidosos da sua fé. Do mesmo modo, havia outros que pecavam gravemente, os apóstatas e blasfemos, os orgulhosos e avarentos e os mundanos que se comportavam como pagãos. Havia ainda alguns ministros da Igreja pouco zelosos no exercício do seu múnus: diáconos que acumulavam riquezas à custa dos bens dos pobres e presbíteros ambiciosos que davam escândalo com as suas lutas e discórdias. O comportamento cobarde destes cristãos foi devido, em parte, ao período de relativa paz que a Igreja gozou, durante o qual os cristãos se foram realmente acostumando aos prazeres de uma vida fácil. Daí que os horrores de uma terrível perseguição os apanharam de surpresa.

É sobretudo a esta minoria que se dirige precisamente o extraordinário apelo à penitência, mediado por Hermas. Por outro lado, a mensagem de penitência e perdão é alargada também a todos os cristãos que a acolherem, como resposta a possíveis propostas rigoristas que levavam muitos pecadores a desesperar da salvação.
Dr.ª Teresa Pereira

Sem comentários:

Enviar um comentário