terça-feira, 20 de abril de 2010

Pastor Hermae: a herança do judeo-cristianismo

Breve resumo doutrinal. Introdução (cont.)

O autor apresenta-se como um cristão leigo e pai de uma família mal sucedida. Proveniente de condição servil, fora conduzido a Roma, e aí vendido como escravo a uma matrona cristã chamada Rode. Embora nada nos informe sobre a sua terra natal, o modo como se refere à Arcádia (Cf. 78,4) leva-nos a pensar poder ser essa a sua terra de origem. Libertado pela sua patroa e tendo-se dedicado ao comércio, acumulou uma considerável fortuna e constituiu família. A sua experiência familiar seria, no entanto, marcada pelo fracasso, devido em grande parte ao carácter difícil da esposa, mas também por culpa própria, pois ao empenhar-se demasiado nos negócios, não soube dedicar a devida atenção à sua casa e à educação dos seus filhos que, como resultado, levariam uma vida dissoluta. Tudo isto acabou por se traduzir no descalabro total da vida económica e familiar de Hermas. Quando adveio a perseguição de Trajano, os seus filhos não só apostataram como denunciaram o próprio pai, o que fez agravar a situação psicológica e moral de Hermas. Ora, é precisamente nesta situação de crise que tem lugar o seu encontro (Visões) com os enviados de Deus que o investem nas funções de profeta encarregado de pregar a penitência à Igreja.

Parece não haver dúvida nenhuma de que toda a obra de Hermas se encontra marcada seguramente pela sua atribulada experiência pessoal e familiar. Profundo conhecedor dos homens e das fraquezas a que se vêem sujeitos os cristãos seus contemporâneos, Hermas aproveita a sua experiência humana, familiar e eclesial para empreender uma espécie de “radiografia” e “exame clínico” do estado de “saúde” da sua Igreja.

Habitualmente inserido entre o grupo dos chamados “Padres Apostólicos”, Herm é um escrito judeo-cristão dificilmente definível quanto ao género literário, uma vez que nele podemos encontrar tanto elementos específicos da oralidade romancesca e epistolográfica, como características do género profético e apocalíptico, constituindo estes dois últimos aspectos a característica dominante deste documento peculiar. De facto, a trama desenvolve-se toda ela num cenário adequado às Visões e revelações mediadas por mensageiros divinos que comunicam aos homens, através de Hermas, uma mensagem urgente de penitência. O autor parece não ser detentor de grande cultura filosófica ou teológica, nem demonstra quaisquer preocupações de ordem literária nem dotes estilísticos. Neste aspecto, o estilo de Herm condiz bem com o que o autor nos dá a conhecer na sua própria biografia.

Dr.ª Teresa Pereira

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