quinta-feira, 11 de junho de 2009

CALÚNIAS, DIFAMAÇÕES E OUTRAS ARTES

Todos convergimos no reconhecimento da grandeza e dignidade do Homem. Todos concordamos que o Homem é um centro de valor e que a sua dignidade vale sempre, sejam quais forem as circunstâncias de cor, raça credo, partido político ou continente onde vive. No entanto, o reconhecimento da sua dignidade é dos exercícios mais agressivamente postos em causa, a troco de tudo e de nada. Por cá, a língua afiada e desenfreada é a arma de destruição massiva mais utilizada. Todos somos vítimas de todos; e todos somos carrascos de todos. A inveja e o desdém jogam a sua cartada nas mais ínvias situações. As vítimas são atacadas no mais profundo da sua dignidade e honra, por comentários desagradáveis, desajustados e maldosos. Isso observa-se a pretexto duma chávena de chá com bolos, ou de umas inocentes cervejas ao fim da tarde: «Não sabes daquela que andava com... e que não descansou enquanto não...»? «Viste o que aconteceu a fulano? Foi bem feito! Estava mesmo a pedi-las! Eu já o tinha avisado. Teve o que merecia»! Milhões de comentários similares a estes – e particularmente a forma provocante como são feitos – têm directas consequências negativas. A pior de todas recai no facto de que se pode dar cabo da vida de um homem ou de uma mulher, matando-os sem os beliscar fisicamente.

Facilmente podemos ser assassinos! Facilmente podemos tirar a vida a um homem matando-lhe a alma, a dignidade, o valor, sem nunca o beliscar na mais pequena fímbria do seu corpo. Não é uma morte com armas brancas ou com armas de guerra; é uma morte provocada pelas armas das ideologias, da lavagem de cérebro, das dosagens de drogas – que matam a vida intelectiva; é uma morte provocada pelas armas da murmuração, da calúnia e da difamação – que matam a alma, a vida de relação, os valores e ideais, o prestígio e a dignidade. Por razões óbvias, vou referir-me somente às armas da calúnia e da difamação, por serem as mais usuais entre pessoas sem escrúpulos. Antes, porém, para aquilatarmos dos efeitos nefastos que as calúnias e as difamações produzem, tentemos, num exercício de imaginação, pedir a uma criança irrequieta que, em dia de vento, atire da janela do quarto andar, uma a uma, todas as pétalas do arranjo de flores que está sobre a mesa. Depois de todas lançadas, peçamos-lhe que vá à rua apanhá-las, também uma a uma, para que seja refeito o arranjo floral. – Impossível, dirá a criança! Impossível será, também, refazer o nome e a dignidade de alguém que, vítima da boca maledicente do mundo, foi alvo de calúnias e difamações.

A calúnia é a afirmação mentirosa, falsa, de algo que se diz contra alguém, com o intuito firme de prejudicar a sua honra. A difamação é a afirmação injusta, tornada pública, que ataca a boa reputação do próximo, mesmo que possa até ser verdadeira. Tanto uma como outra matam de igual modo a dignidade. A primeira, por mentirosa; a segunda, por inoportuna. Sendo a honra um bem espiritual de inegável importância para o indivíduo, para a família e para a comunidade, o atentar contra ela é algo muito grave. Atenta-se contra a honra não só quando se calunia e difama com intenção má e consciente, mas também quando se é imprudente. E também quando se usa um malicioso silêncio! A sua gravidade mede-se pelo escândalo que provoca, pelo prejuízo que causa, pelo estorvo posto à actividade profissional e pelas possíveis perdas materiais, como sejam o posto de trabalho ou de negócio. A magnitude do prejuízo não depende unicamente das afirmações desonrosas, mas muito especialmente das circunstâncias e da condição socioprofissional do difamado, do difamador e de quem o escuta. Todos conhecemos vários casos públicos, do foro judicial, do foro político, ou do foro sentimental, relatados nos meios de comunicação social, em que se «mataram» muitas pessoas na sua dignidade. Trata-se de gente morta no mais profundo de si, com recuperação ainda possível, mas muito lenta; e nunca mais serão como antes.

P. Madureira da Silva

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